VIOLÊNCIA DO ESTADO (2)
O anti-semitismo do regime nazista já povoava o ideário de seu líder – Adolf Hitler – desde a década de 20, ocasião em que chegou a publicar um livro (Mein Kampf).
De 1933 a 1938 começam as restrições ao povo judeu, cerceamento da liberdade de locomoção, restrições de acesso à saúde – médicos judeus só podiam atender pacientes judeus e vice-versa.
A partir de 1938 o regime intensifica a retaliação com o confisco de propriedades dos judeus e a venda dessas mercadorias nos “mercados”, algo como uma feira-livre, para o povo alemão – restrição ao direito de propriedade.
A Polônia, país com a maior concentração judaica na Europa, é invadida em 01 de setembro de 1939 e totalmente dominada em pouco mais de um mês. A partir de então o exército regular alemão (Wehrmacht) invade a Dinamarca, Noruega, Bélgica, Holanda e a França, em junho de 1940. A política, então, já era de extermínio direto de judeus, mas era uma “eliminação no varejo”, portanto, onerosa.
Surgem os “guetos” em algumas cidades como solução para concentração dos judeus, dentre os quais comentaremos o da cidade de Varsóvia para expor a política anti-semita do III Reich.
Confinados nesses “condomínios fechados”, verdadeiras prisões em área urbana, os judeus passam a sofrer as maiores degradações já vistas na história, a ordem social é descaracterizada para o povo judeu, a violência estatal abate-se sobre a população dos “guetos” colocando-os à margem da sociedade – a exclusão social.
O sentimento de imprevisibilidade abate-se sobre a população oprimida, com redução da auto-estima e o terror a assombrá-los diariamente.
Numa alusão a Aristóteles, já descrita anteriormente, o povo judeu torna-se um somatório de indivíduos medrosos.
A população do “gueto de Varsóvia”, diante da opressão, da escassez e do medo da morte violenta, inicia uma rebelião com tentativas de fuga e desordens pontuais nos portões da barreira que o cercava. Esse fenômeno entra para a história como o “levante de Varsóvia” e as conseqüências são catastróficas, como se apresenta no relatório transcrito do site Varsóvia Online (http://www.varsovia.jor.br):
Relatório do SS Brigadenführer Stroop
após a "vitória" sobre o gueto de Varsóvia
No dia 19 de abril, às 8 horas, assumi o comando das forças incumbidas de sufocar o Levante do Gueto, que teve início no mesmo dia, às 6 horas.
Quando penetramos no gueto os judeus conseguiram nos repelir com fogo cruzado bem preparado. Os nossos comandos, inclusive tanques e carros blindados foram obrigados a recuar. A resistência dos judeus e bandidos só poderia ser contida com as nossas respostas enérgicas, durante o período diurno e noturno ...
Portanto ordenei destruir e incendiar o Gueto...
Os judeus permaneciam e atiravam dos prédios em chamas e só saltavam das janelas e telhados quando o calor se tornava insuportável. Alguns, após cair, com os ossos partidos tentavam atravessar a rua, rastejando, sem largar as armas e atingir os prédios intactos.
Muitos judeus escondiam-se nos esgotos. Para expulsa-los lançávamos bombas de gás lacrimogêneo e granadas de mão. Muitos judeus foram capturados. Muitos morreram com as explosões nos esgotos e abrigos.
Quanto mais demorava a resistência mais violentos se tornavam meus homens. Tanto da SS, como da polícia e Wehrmacht. Mas sempre cumprindo meu dever de modo exemplar...Graças aos meus homens, conseguimos desentocar 56.065 judeus cujo extermínio pode ser comprovado.
Esse total não inclui os judeus que perderam a vida nas explosões e nos incêndios, o que é impossível de calcular.
Com a destruição da Sinagoga de Varsóvia, no dia 16 de maio de 1943, às 20:15 horas, foi terminada a tarefa de liquidação do Gueto.
O Gueto não existe mais!
Assinado SS Brigadenführer
Jurgen Stroop
Löic Wacquant (As prisões da miséria, 2001) em sua pesquisa sobre a quebra da democracia pela redução da dimensão social do Estado a partir do fim da 2ª Guerra Mundial, mostra-nos a convergência entre dois fenômenos :
1. redução do estado social e do estado econômico:
· o encolhimento dos regimes de proteção social;
· retração do estado na esfera econômica passando tal encargo ao mercado – privatizações;
· banqueiros na direção dos Bancos Centrais.
2. aumento do estado penal:
· aumento da população carcerária – um pesado fardo financeiro;
· a privatização das prisões estimulando interesses no aumento da massa carcerária;
· privatização da segurança.
Visualizando graficamente essa convergência podemos representar:
Fica inequivocamente comprovada a transformação da ordem social, de um modelo para o outro, sendo mostrada a redução dos investimentos, nos EUA, ano após ano, na rede de proteção social (sistema previdenciário, educação, saúde...) e a contrapartida no aparelhamento da polícia, no sistema de justiça criminal e no sistema carcerário.
Há que se fazer uma crítica séria a política pública de “tolerância zero” dos EUA, donde se pode abstrair as seguintes observações:
1. custos sociais – política orientada totalmente para a quantificação da incidência criminal;
2. a política de “tolerância zero” tenta provar que é possível “enxugar o gelo de forma eficaz”;
3. atribui o bom desempenho policial à redução dos índices de criminalidade.
Essa política pública decorre da contribuição decisiva dos "think tanks" (algo parecido com institutos de pesquisa), provocados a produzir estudos que apresentassem propostas de solução para os problemas dos imigrantes, da população de rua, dos negros, enfim, dos pobres – os excluídos financeiramente - que residem nos grandes centros, particularmente na cidade de New York. O viés dessa doutrina é a teoria da “vidraça quebrada” (broken window).
O prefeito Rudolph Giuliani atribui a desordem social à proliferação dos pequenos passadores de drogas, aos mendigos, às prostitutas e aos pichadores estabelecendo as áreas da cidade onde esses “inimigos sociais”
se concentram maximizando nesses locais as atividades policiais repressivas.
É a penalização da miséria.
O Estado Penal, de conformidade com o modelo norte-americano, traduz-se:
1. numa política de criminalização da miséria;
2. na imposição do trabalho assalariado precário como obrigação cívica.
Comparativamente com o Holocausto vivido pelos judeus sob o jugo do III Reich, pode-se observar alguma parecença:
Holocausto
1. inimigo(alvo): judeus
2. espaço físico: guetos e campos de concentração
3. política pública: exclusiva pela eliminação física
Tolerância zero
1. inimigo(alvo): traficantes, prostitutas, mendigos, negros e imigrantes latinos
2. espaço físico: áreas críticas (bairros urbanos)
3. política pública: exclusiva - pela criminalização e encarceramento.
E ainda existem aqueles que defendem a adoção de tal política aqui no Brasil.
Só a título de esclarecimento, registre-se que países como Holanda, Bélgica, Inglaterra e França tentaram na década de 90 copiar o modelo norte-americano e enfrentaram violenta rejeição por parte da sociedade, abandonando-o logo após alguns meses de implantação.
O “Tolerância Zero”, no modelo americano, transforma o encarceramento de pessoas em “business”, pois as prisões privatizadas são empresas produtivas e necessitam cada vez mais de “mão-de-obra”. Isso tudo aliado a um governo que retira cada vez mais do orçamento os benefícios sociais, temos um resultado perverso com o aumento do número de desempregados, ou subempregados, e conseqüentemente excluídos da rede de proteção social – passíveis de serem “recolhidos à prisão” por vadiagem ou pequenos delitos – prostituição, furto, pichadores, etc; segundo Wacquant.
Assim, de forma cronológica e pontual, evidencia-se a violência do Estado ao longo da História, sem contudo sequer ter havido a pretensão de esgotar o assunto, pois ficaram margeando o estudo os regimes ditos “de esquerda” – onde sem dúvida a crueldade do Estado tem registros bastante consistentes – exceção feita tão somente em relação ao nazismo.
Por derradeiro deixo um tema à reflexão: "a democracia é um modelo frouxo, permeável, flexível, elástico e amorfo; entretanto é o único que garante e assegura a vida, a liberdade e a propriedade a todos contra a opressão do Estado e de seus representantes."
Muito Obrigado!
8 Comments:
Excelente, Alexandre!
E tem gente que "não vê" que a democracia tem sido usada pela esquerda para para derrubar o Estado de Direito que é o único que assegura a vida, a propriedade, a liberdade contra o Estado opressor.
Grande Abraço.
As leis devem expressar a vontade do povo, não os caprichos de reis, ditadores, militares, líderes religiosos ou partidos políticos auto-nomeados.
Tenho asco total a tudo que se refere á coisas forçadas, à desproporção nas lutas, ao forte exterminando o fraco, à tortura como meio de extrair a verdade (que nunca é verdade), puxa amigo, esses modos psicopáticos de força me enojam mesmo! Argh!
VC, Alkimistas e a Santa compartilham da mesma opinião q eu tenho a respeito do assunto...
Isso se aplica tb a religiões... os extremistas e ambiciosos distorcem tudo a seu bel prazer com o intuito de manipular e adquirir o poder. Nunca movidos por idealismo ou sentimentos puros e inocentes.
É a lei da selva, o mais forte subjulgando o mais fraco.
Infelizmente a raça humana não usa apenas instinto e sim a astúcia e a ganância...
Os animais são mais "honestos e coerentes".
Tenho medo que na reforma política anunciada por Lula ele introduza alguns dos preceitos de Hitler, proponha a troca do regime para Monarquia e requeira o título de Pharaó.
Abraços,
Continuo sem poder ficar muito tempo sentado, daí a dificuldade de visitar os amigos.
Sobre "Tolerância Zero", no ponto em que vocÊ fala da "indústria das prisões" eu vejo isto de forma positiva. Porque a indústria do crime é muito mais produtiva do que pode suportar a "capacidade produtiva" do Estado em prender criminosos. A menos que se encontre um sistema corrompido ao ponto de juízes fraudarem vereditos em favor de empresas que controlam prisões, é louvável SIM a iniciativa de oprimir ainda mais o crime em forma de prisões. Se há crimes, eles devem ser punidos!
Outro ponto que gostaria de comentar é o uso da expressão "excluído". Mas isto é tema para outro comentário...
Abraços,
Ângelo
Muito bonita a conversa de voces mas cheia de hipocrisia, e , é justamente por causa de pessoas com voces que o mundo está assim. Querem fazer igualdade por decreto, tiram o trabalho dos pobres, colocam utopias inacessiveis na cabeça de que muitas vezes não sequer tem saude para entende-las,por isso a sociedade está pagando o preço pelas besteiras que faz . Ninguem como educação. O que precisa é aperfeiçoar o carater e o povo obedecer as leis se querem viver em sociedade e democracia. Aqui no nordeste, uma carroça de carregar água tem mais utilidade prática do que internet e outra coisas mais.
Muito bonita a conversa de voces mas cheia de hipocrisia, e , é justamente por causa de pessoas com voces que o mundo está assim. Querem fazer igualdade por decreto, tiram o trabalho dos pobres, colocam utopias inacessiveis na cabeça de que muitas vezes não sequer tem saude para entende-las,por isso a sociedade está pagando o preço pelas besteiras que faz . Ninguem como educação. O que precisa é aperfeiçoar o carater e o povo obedecer as leis se querem viver em sociedade e democracia. Aqui no nordeste, uma carroça de carregar água tem mais utilidade prática do que internet e outra coisas mais.
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