DO SOCIALISMO AO DESPOTISMO - PARTE IV
ESTADO SOCIAL X ESTADO PENAL
Löic Wacquant (“As prisões da miséria, 2001”) em sua pesquisa sobre a quebra da democracia pela redução da dimensão social do Estado a partir do fim da 2ª Guerra Mundial, mostra-nos a convergência entre dois fenômenos :
1. redução do estado social e do estado econômico:
2. aumento do estado penal:
Uma visualização gráfica dessa convergência nos mostraria:
Exemplifica inequivocamente a transformação da ordem social, de um modelo para o outro, mostrando a redução dos investimentos, nos EUA, ano após ano, na rede de proteção social (sistema previdenciário, educação, saúde...) e uma contrapartida no aparelhamento da polícia, no sistema de justiça criminal e no sistema carcerário.
Faz uma crítica a política pública de “Tolerância Zero” dos EUA, de onde podemos extrair as seguintes observações:
Essa política pública decorre da contribuição decisiva dos think tanks, provocados a produzir estudos que apresentassem propostas de solução para os problemas dos imigrantes, da população de rua, dos negros, enfim, dos pobres – os excluídos financeiramente - que residem nos grandes centros, particularmente na cidade de New York. O viés dessa doutrina é a teoria da “vidraça quebrada” (broken window), numa alusão àquele indivíduo que atira uma pedra numa vidraça como potencialmente perigoso para a seguir assaltar um banco, por exemplo. O prefeito Rudolph Giuliani atribui a desordem social à proliferação dos pequenos passadores de drogas, aos mendigos, às prostitutas e aos pichadores estabelecendo as áreas da cidade onde esses “inimigos sociais” se concentram maximizando nesses locais as atividades policiais repressivas. É a verdadeira penalização da miséria.
O Estado Penal, de conformidade com o modelo norte-americano, traduz-se:
1. numa política de criminalização da miséria;
2. na imposição do trabalho assalariado precário como obrigação cívica.
Comparativamente com o Holocausto vivido e narrado por Primo Levi (“É isto um homem?”), podemos até observar alguma parecença:
Holocausto
Tolerância Zero
Existem muitas vertentes para o enfrentamento da questão dos excluídos sociais, mas duas em particular merecem especial destaque, pelas similitudes com modelos conhecidos: uma seria através de programas populistas de inclusão social através de subsídios diretos às minorias e excluídos, como “sacolão-família” ou “fome nunca mais” (denominações fictícias para não estabelecer paralelismos) e outra seria através de incentivos aos meios de produção para a geração de empregos e o crescimento da produção, como por exemplo através de investimentos em educação, redução da carga tributária, enxugamento da máquina estatal, privatizações e ações menos intervencionistas no mercado.
A diferença entre elas é que na primeira obtém-se resultados de curtíssimo prazo, com um grande alcance, às expensas de uma tributação cada vez maior sobre aqueles que produzem, mas sem efetividade, o que a insere no rol das políticas públicas que tentam provar que “é possível enxugar o gelo de forma eficaz” (se usarmos muitos panos secos e esfregarmos bem rápido... talvez consigamos), como o "Tolerância Zero".
A segunda não é tão “lucrativa”, eleitoralmente falando, para o dirigente público que a implanta, pois seus resultados tendem a surgir no médio e longo prazo, mas sem dúvida é mais efetiva e estável para a população-alvo, pois ao invés de receber um “peixe”, o alvo é treinado para “pescar”, e ainda lhe é oferecido um lago-cativeiro repleto de “peixes”, metaforizando todas as medidas que foram elencadas acima. É risível que ainda existam aqueles que preguem o modelo populista como política pública ou programa de governo, concomitantemente é de prantear que ainda exista quem os eleja.
(continua)
Löic Wacquant (“As prisões da miséria, 2001”) em sua pesquisa sobre a quebra da democracia pela redução da dimensão social do Estado a partir do fim da 2ª Guerra Mundial, mostra-nos a convergência entre dois fenômenos :
1. redução do estado social e do estado econômico:
- o encolhimento dos regimes de proteção social;
- retração do estado na esfera econômica passando tal encargo ao mercado – privatizações;
- banqueiros na direção dos Bancos Centrais.
2. aumento do estado penal:
- aumento da população carcerária – um pesado fardo financeiro;
- a privatização das prisões estimulando interesses no aumento da massa carcerária;
- privatização da segurança.
Uma visualização gráfica dessa convergência nos mostraria:
Exemplifica inequivocamente a transformação da ordem social, de um modelo para o outro, mostrando a redução dos investimentos, nos EUA, ano após ano, na rede de proteção social (sistema previdenciário, educação, saúde...) e uma contrapartida no aparelhamento da polícia, no sistema de justiça criminal e no sistema carcerário.
Faz uma crítica a política pública de “Tolerância Zero” dos EUA, de onde podemos extrair as seguintes observações:
- custos sociais – política orientada totalmente para a quantificação da incidência criminal;
- a política de “tolerância zero” tenta provar que é possível “enxugar o gelo de forma eficaz”;
- atribui o bom desempenho policial à redução dos índices de criminalidade.
Essa política pública decorre da contribuição decisiva dos think tanks, provocados a produzir estudos que apresentassem propostas de solução para os problemas dos imigrantes, da população de rua, dos negros, enfim, dos pobres – os excluídos financeiramente - que residem nos grandes centros, particularmente na cidade de New York. O viés dessa doutrina é a teoria da “vidraça quebrada” (broken window), numa alusão àquele indivíduo que atira uma pedra numa vidraça como potencialmente perigoso para a seguir assaltar um banco, por exemplo. O prefeito Rudolph Giuliani atribui a desordem social à proliferação dos pequenos passadores de drogas, aos mendigos, às prostitutas e aos pichadores estabelecendo as áreas da cidade onde esses “inimigos sociais” se concentram maximizando nesses locais as atividades policiais repressivas. É a verdadeira penalização da miséria.
O Estado Penal, de conformidade com o modelo norte-americano, traduz-se:
1. numa política de criminalização da miséria;
2. na imposição do trabalho assalariado precário como obrigação cívica.
Comparativamente com o Holocausto vivido e narrado por Primo Levi (“É isto um homem?”), podemos até observar alguma parecença:
Holocausto
- inimigo(alvo): judeus
- espaço físico: guetos e campos de concentração
- política pública: exclusiva pela eliminação física
Tolerância Zero
- inimigo(alvo): traficantes, prostitutas, mendigos, negros e imigrantes latinos
- espaço físico: áreas críticas (bairros urbanos)
- política pública: exclusiva pela criminalização da miséria e encarceramento dos pobres.
Existem muitas vertentes para o enfrentamento da questão dos excluídos sociais, mas duas em particular merecem especial destaque, pelas similitudes com modelos conhecidos: uma seria através de programas populistas de inclusão social através de subsídios diretos às minorias e excluídos, como “sacolão-família” ou “fome nunca mais” (denominações fictícias para não estabelecer paralelismos) e outra seria através de incentivos aos meios de produção para a geração de empregos e o crescimento da produção, como por exemplo através de investimentos em educação, redução da carga tributária, enxugamento da máquina estatal, privatizações e ações menos intervencionistas no mercado.
A diferença entre elas é que na primeira obtém-se resultados de curtíssimo prazo, com um grande alcance, às expensas de uma tributação cada vez maior sobre aqueles que produzem, mas sem efetividade, o que a insere no rol das políticas públicas que tentam provar que “é possível enxugar o gelo de forma eficaz” (se usarmos muitos panos secos e esfregarmos bem rápido... talvez consigamos), como o "Tolerância Zero".
A segunda não é tão “lucrativa”, eleitoralmente falando, para o dirigente público que a implanta, pois seus resultados tendem a surgir no médio e longo prazo, mas sem dúvida é mais efetiva e estável para a população-alvo, pois ao invés de receber um “peixe”, o alvo é treinado para “pescar”, e ainda lhe é oferecido um lago-cativeiro repleto de “peixes”, metaforizando todas as medidas que foram elencadas acima. É risível que ainda existam aqueles que preguem o modelo populista como política pública ou programa de governo, concomitantemente é de prantear que ainda exista quem os eleja.
(continua)
13 Comments:
Alexandre, foi excepcional essa "aula". E, ao final, eu me pergunto e a você, mestre: por quê?
Por que os governos sabendo de todas essas implicações, no longo prazo, de sua irresponsabilidade, não conseguem transpor os interesses pessoais e tenatr iniciar alguma forma efetiva de reduzir a miséria e com ela, a violência (na ótica deles)?
Sim, você explicou sobre os efeitos ímediatos das políticas paternalistas. Porém, como todos estão vendo entre as comunidades islâmicas, essa postura só poderá conduzir ao caos.
Seria esse o objetivo dos "gigantes"? Criar o caos para, ao final, impor-se totalitariamente, como em Orwell?
Estamos caminhando, como cordeiros para 1984?
Saramar.
Espero, ao final destes capítulos, fornecer a você os subsídios para que encontre as respostas, pois estas serão as melhores para você.
Assim deve agir o Estado. Um facilitador, ao invés de provedor.
Um beijo, anjo.
Alexandre
O melhor de tudo, voce discorreu durante todo texto. O pior de tudo, voce deixou pro final. Como cineasta, voce se daria mal, já que todo mundo espera um final felz rsssss.
Mas esse pior reflete a sua clavidncia. Lula, Chavez, Evo Morales, acreditam naquela outra alternativa.
Ou melhor eles não acreditam em nada porque nada sabem.^
Parabéns, continuo na primeira fila. abs.
Alexandre
Tem uma tarefa pra voce fazer lá na Moita.
Abraços
Olá!
É a primeira vez que visito seu blog, e logo de kra adorei os textos e o visual!
Adoraria receber sua visita!
Se puder deixar algumas dicas pra meu blog, chegar pelo menos aos pés do seu ficarei muito feliz!
Até +
Primeiro, agradecendo sua passada pelo meu Blog. A casa está sempre aberta aosamigos.
Segundo, parabéns pelo seu Blog, quanta qualidade num só lugar.
Tão logo resolva uns probleminhas técnicos por aqui farei questão de te recomendar no meu.
Abç
Alexadre,
Você deve visitar meu blog urgente, tenho uma missão para você. Sei que você não corre da luta, e aceita desafios fortes. :)
Lá no blog leia, "Manias? Eu?". :)
Agora li seu artigo.
Na verdade um seminário muito bom.
Receba meus parabéns.
A analogia entre os principios, que norteiam a "Tolerância Zero" e o Holocausto, é perfeita e cabal.
Devemos nos manter atentos, e lutar sempre, contra essas exacerbações do direito do Estado sobre o estado de Direito, penalizando o direito individual, e sobrepondo a este, o direito de grupos, chamados "sociedade organizada".
Alex,
Não há dúvida de que seu texto é magnifíco. Agora, para mim, o interessante são os paralelismos sim. Vejo, no Brasil, e sou contra a transposição da situação norte-americana que é completamente diferente, o fato de que, aqui, não criamos o capitalismo, na sua acepção, não passamos por um estado liberal. O desenvolvimento, aqui, se deu por meio do Estado, que era por excelência colonial e patrimonialista, para o desenvolvimentista. Nós não temos, a rigor, grandes empresas nacionais, grandes capitalistas. Temos o poder do Estado e das multinacionais. E o Estado, no Brasil, é opressivo: são mais de 70 mil leis, a maior carga tributária do mundo, serviços tão ruins que fazem de nosso país o emergente com maior grau de analfabetismo, burocracia e corrupção, complemento lógico. Por tal razão "desestatizar" nossa vida é imprescindível. Concordo plenamente que o Estado deva cuidar do social, mas não subsiste se não tiver o substrato econômico e para tê-lo é preciso criar um ambiente de empreendedorismo, onde a iniciativa privada seja valorizada. E olha que quem está lhe falando já foi um especialista em Marx que, hoje, prefere até Bakunin. Um abraço carinhoso. Você é de fato um pensador. Silvio
Alexandre
Voce não publicou as suas manias.
Tem gente me cobrando.
Ah! Deixa te perguntar.
Toda parta da esquerda da Moita desapareceu de repente. Perfil, links dos amigos e arquivos. Não sei o que houve. Tens alguma idéia a respeito? Um abraço.
Alexandre, eu vim cobrar direto na fonte.
Você foi convocado pelo Moita e pelo Nemerson e estou curiosíssima para descobrir suas manias. Mas, não me venha, como todos, apenas com as manias bonitinhas, certo?
rsssssssss.
Acabei de dizer ao Nemerson que somos todos muito parecidos.
Vá lá no Janelas ver as minhas manias, convocada que fui pela magnífica Santa.
Beijos, querido.
P.S. Não se esqueça do champanhe amanhã.
Alexandre,
Você está se superando! Comparar o Holocausto com o Tolerância Zero foi simplesmente brilhante. Além disso vc foi ao cerne da questão... assistencialismo de curto-prazo vs políticas de incentivos aos meios de produção.
À espera da continuação...
Bjs
Caríssimos(as) comentaristas!
Tenho algo que irá AO ENCONTRO do que me pedem, porém (como já dizia "o esquartejador") vamos por partes.
Após este módulo enviarei um "certificado" para aqueles que me honraram com seus comments e visitas, ato contínuo preparo algo que irá "escancarar" tudo que vemos atualmente na "América Latrina" e uma alternativa para sair deste "enrôsco".
Irei postar, sem dúvida, minhas MANIAS. Só não encontro mais para quem repassar, pois acho que todos já receberam(pelo menos dos que conheço...).
Atenciosamente,
Alexandre
Postar um comentário
<< Home